Lição de luta no <i>call-center</i>
Com a luta que culminou na greve de 31 de Março, a CRH, a Tempo Team e, sobretudo, a EDP ficaram a saber que os trabalhadores do atendimento comercial estão unidos e firmes na defesa dos seus justos direitos e interesses.
A EDP é responsável pelo aumento da precariedade
O call-center da EDP foi uma das primeiras áreas que a eléctrica entregou a uma «prestadora de serviços», quando governos e suas administrações a colocaram no caminho da privatização e da corrida ao lucro, para bem dos grandes accionistas.
Numa história com duas décadas, os serviços do atendimento telefónico da área comercial passaram a ser executados, através da CRH Consultoria e Valorização, que tinha um contrato de prestação de serviços com a EDP Soluções Comerciais, por cerca de 700 trabalhadores (mulheres, na sua maioria) com vínculos laborais precários e com salários e direitos bastante inferiores aos que tinham sido conquistados pelo pessoal da EDP. As instalações distribuíam-se pela Póvoa de Santo Adrião (Odivelas), a Matinha (Lisboa) e Seia.
Poupar para o capital
Os trabalhadores ficavam assim excluídos da aplicação do Acordo Colectivo de Trabalho que vigora no Grupo EDP. Manuel Correia, dirigente do Sindicato das Indústrias Eléctricas do Sul e Ilhas e da CGTP-IN, estima que a EDP poupe até metade do salário de cada trabalhador com esta política de outsourcing.
O SIESI manteve ligação ao pessoal da CRH desde o início e foi dessa base que surgiu a resposta ao sobressalto que marcou o final do ano passado.
Em Dezembro, foi decretada a insolvência da CRH e a EDP decidiu deixá-la de fora do concurso para assegurar o serviço após 31 de Março de 2011. Se contassem apenas os objectivos das empresas, os trabalhadores ficariam sem emprego e sem quaisquer direitos reconhecidos (o que significaria prejuízos pesados). Mas em Janeiro e Fevereiro, o SIESI desencadeou contactos e plenários, aumentou a sindicalização, reforçou a organização. Com forte apoio dos trabalhadores da CRH, exigiu das empresas a garantia dos postos de trabalho e dos direitos, bem como a preservação das condições de prestação do trabalho. Se a CRH mostrou logo querer escapar às suas responsabilidades, a anunciada ganhadora do concurso da EDP, a Tempo Team, não ficou atrás e começou por nem sequer garantir os postos de trabalho.
Perante a mobilização e na iminência de ocorrerem greves, a EDP fez uma revisão das condições do contrato de outsourcing. Acabou por comunicar ao sindicato que a Tempo Team aceitava manter os postos de trabalho e as demais condições contratuais, incluindo a contagem de tempo para antiguidade.
Já a CRH persistiu, até ao fim, em escapar às suas responsabilidades. «A intenção é meter ao bolso o que legitimamente é nosso», acusava-se num comunicado que o SIESI distribuiu a 29 de Março, apelando à participação na greve de dia 31. Nas razões para esta luta, o sindicato apontou o pagamento do prémio de assiduidade e do subsídio de transporte de Março; o gozo ou pagamento de mais de mil dias de férias vencidas dos trabalhadores com contrato a termo incerto; o pagamento integral dos descansos compensatórios; o pagamento dos créditos por cessação do contrato dos trabalhadores de licença ou baixa; a regularização de descontos feitos nos subsídios de refeição, por motivo de atrasos diários.
Também não estava assegurado o pagamento dos salários de Março, como nos referiu Manuel Correia, sublinhando que, com a marcação da greve, as empresas aperceberam-se da grande unidade e determinação das trabalhadoras. Por outro lado, e apesar do processo de insolvência, o Grupo CRH mantém ainda outros contratos com a EDP, o que também terá contado para um desfecho positivo: todas aquelas razões de descontentamento e luta foram eliminadas ou vão ficar resolvidas até ao dia de amanhã, 8 de Abril.
Este caso – salienta o dirigente do SIESI, que igualmente faz parte do Comité Central do PCP – veio comprovar a força da unidade e da luta dos trabalhadores. Mas esta vitória, inédita em empresas prestadoras de serviços, veio igualmente demonstrar à EDP que não pode continuar a fomentar a precariedade, uma vez que o atendimento é uma área imprescindível, que a eléctrica está obrigada a disponibilizar aos consumidores, no quadro da concessão pública do serviço universal. E fica também claro o aviso, para que a Tempo Team trate o pessoal com a dignidade exigida.
Na concentração de dia 31, na Póvoa de Santo Adrião, compareceu Miguel Tiago, deputado do PCP. Na Assembleia da República, os comunistas questionaram várias vezes o Governo PS sobre este problema.